segunda-feira, outubro 27, 2008

O domingo cultural

Muda a hora, o clima e a disposição. Mergulhos? Só na minha banheira de palmo e meio. Impõem-se outros programas mais adequados à temperatura que se aproxima. Rumo, então, à Gulbenkian, onde desfruto da última parte da maratona de fim de semana dedicada a Sergei Rachmaninoff. Brilhante! Não fosse ele o meu compositor preferido. No entanto, para mim, uma ida a um concerto de música clássica não é somente escutar cerca de três horas de grandiosas obras. Nada disso. Encaro uma ida a estes concertos como verdadeiras experiências sociologicas. Talvez porque tenho a mania de reparar em tudo e em todos que me rodeiam, gosto de estar ali sentado, no meio do desconhecido, a observar as reacções da minha vizinhança. Não é nenhuma tara, e tão pouco serei um estudioso da matéria. Apenas diria que sou um curioso. Mais nada. Gosto de ver as expressões das pessoas. Gosto de tentar perceber o que lhes vai na alma. Gosto de ver as suas reacções. Desenganem-se os que pensam que vou a estes locais à procura de conquistas fáceis. A menos que fosse um fanático da gerontologia! De outra forma não tinha qualquer hipótese. Ali só se vêem cabecinhas grisalhas. E no ar respira-se uma mescla de laca e daqueles perfumes que apenas cheiramos no Natal quando vamos ao jantar das tias. Mas há uma palavra que define estes concertos. Sim, a tosse. No meio de tanta classe (senhoras muito bem arranjadas, blazers com botões dourados, broches e joias afins), não há pausa em que não se oiça a já conhecida "tosse portuguesa." Muito tosse aquela gente! Chega a ser irritante. E não só para mim. Às duas por três, lá reparava na irritação do pianista. Pelo que consta, já houve quem se irritasse a sério com a barulheira. Alguns maestros chegaram mesmo a abandonar a sala e a deixar a actuação a meio. Porque tossir no meio daquela acústica gera um som deveras horrendo. Num dos intervalos, percebi pelas minhas vizinhas da frente que, controlar aquela tosse não é pêra doce. E parece que até tive sorte, pois no Coliseu de Lisboa é bem pior. "São aquelas correntes de ar fortíssimas!" E com a tosse vem o "Xuuuuu!!!" dos indignados. Três filas à minha frente do lado direito, houve uma senhora que teve um "Xuuuuuuuu!!!!" como chamada de atenção. Mas parece que acatou a ordem. Levou o resto do concerto a soluçar, como se tossisse para dentro. Tive pena da senhora, e quase que me senti tentado a oferecer-lhe uma das minhas pastilhas de mentol.

2 comentários:

Maria Brandão disse...

Fantástico o teu domingo a ouvir R. e a apreciar as idiossincrasias dos velhinhos. Uma experiência e tanto! Quanto à tua banheira de palmo e meio, bom, não dá p banho mas tem o melhor duche de Lx. Beijos***

Anónimo disse...

Bem.......... Sim senhora!!! Aleluia!!! Depois de 98 dias bem contados ao minuto... voilá... a inspiração volta!

Bem vido e que essa inspiração tenha vindo para ficar!

Bjos
Margarida