Esqueçam tudo

Esqueçam tudo o que vos ensinaram. Esqueçam todos os valores que vos foram passados pelos vossos pais e avós. Esqueçam todas as horas agradáveis que passaram em família. Esqueçam todas as horas de brincadeira enquanto crianças. Esqueçam que já houve uma altura em que não existiam telemóveis e que, se combinassem uma hora e um local, os vossos amigos apareciam. Esqueçam que o café se fazia numa cafeteira de aço inoxidável. Esqueçam que nem sempre lavavam as mãos antes de se sentarem à mesa. Esqueçam que comiam fruta apanhada directamente da árvore. Esqueçam aquela altura em que só havia um carro para a família e as voltas que se davam até que todos fossem distribuídos. Esqueçam os ricos lanches que faziam na praia. Esqueçam os timidos golinhos que davam nas cervejas dos vossos pais. Esqueçam os cigarrinhos que fumavam às escondidas e da bola de pastilha elástica que faziam para disfarçar o hálito. Esqueçam os peidos que davam para os frascos. Esqueçam que antigamente se compravam carros em segunda e em terceira mão. Esqueçam as roupas que passavam de geração em geração. Esqueçam as bicicletas que foram dos vossos irmãos antes de serem vossas. Esqueçam as cabanas e as subidas às árvores. Esqueçam as chapadas que levavam quando diziam um palavrão à frente da família. Esqueçam que nem sempre era possível ter tudo o que viam na prateleira do super-mercado. Esqueçam as vossas idas ao cinema em grupos de trinta, quando não era possível sair à noite para mais parte nenhuma. Esqueçam as grandes jantaradas que fizeram com os vossos amigos. Esqueçam as vezes que riram como uns perdidos com as situações mais estúpidas que se possam imaginar. Esqueçam a vergonha que sentiam quando viam um beijo numa novela com os vossos pais sentados ao lado. Esqueçam as cenas de pancadaria entre amigos e os sinceros pedidos de desculpa. Esqueçam que bebiam água da torneira. Esqueçam as vezes que gamavam o carro aos pais para uma pequena voltinha antes dos 18 anos. Esqueçam as corridas que faziam nas motos dos amigos. Esqueçam as vezes que fugiam de casa só para estar mais duas horinhas com os amigos. Esqueçam as brincadeiras na lama. Esqueçam que já houve um tempo em que se estavam a cagar para a opinião dos outros. Esqueçam que já sairam à noite para se divertirem e não para serem vistos. Esqueçam todas as bebedeiras que já apanharam. Esqueçam as charradas que já fumaram. Esqueçam que antes cumpriam horas para chegar a casa. Esqueçam como era bom andar no engate. Esqueçam o baile que davam às garinas e as negas com sorrisos, a consentir, que elas davam aos rapazes. Esqueçam as cartas de amor que escreveram. Esqueçam a coragem que era preciso para convidar uma miúda para sair e depois como corriam tão bem as coisas.

Agoram olhem para o espelho e vejam a figura de idiotas que andam a fazer.

Dedico estas linhas a todos os enconados e enconadas que por aí andam, que esqueçaram como viviam descontraídos há pouco tempo atrás, que esqueceram tudo o que era bom e que começaram a viver estupidamente, dando mais valor a coisas sem interesse e a relações mais para “inglês ver” do que para ser feliz. Ainda vão a tempo de abrir os olhos e de começar a curtir a vida, de deixar de pensar em merdas sem interesse e de começarem a dar mais valor às pessoas que vos rodeiam.